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Tributação e Sustentabilidade: Movimento slow fashion e o consumo consciente

Tributário

20 de dezembro de 2022

Há algum tempo é tema de profundo debate na comunidade internacional a necessidade de implementação de medidas mais eficientes à preservação ambiental, de forma a atingir um desenvolvimento sustentável, apto a se equilibrar com a necessidade de assegurar uma melhor qualidade de vida, tanto para a geração atual, quanto para as futuras.

Sob o ponto de vista da economia mundial, sabemos que o setor produtivo visa o crescimento e a expansão das suas atividades, sempre em busca do lucro, como força motriz para qualquer empresa no âmbito privado.

Assim, ao analisar de modo específico o setor da moda, é possível observar que o mercado têxtil é uma das maiores indústrias em termos de integração de cadeias de valor global.

Ocorre que, nas últimas décadas, houve um crescimento da produção voltada à obtenção daquilo considerado “novo”, sem apresentar maiores reflexões acerca do consumo consciente e dos inevitáveis impactos ambientais. Esse movimento é chamado de fast-fashion.

Em outras palavras, tal modelo industrial promove a redução do ciclo linear de produção, uso e descarte de produtos, em uma verdadeira aceleração de aquisição em massa de novas tendências.

No entanto, os impactos já eram previsíveis. Dados alarmantes apresentados no report publicado em 2017 pela Ellen MacArthur Foundation indicam que, no mundo, o número médio de vezes que uma roupa é usada antes de ser descartada diminuiu 36% em comparação com 15 anos atrás.

Diante desse cenário, ressalta-se a interessante estratégia proposta à indústria fashion durante a COP 26, que sugeriu a redução da emissão de carbono em 50%, no setor, até 2030[1].

Isso foi necessário, porque, dentre toda a emissão de carbono produzida pela humanidade, de 2% a 8% desse volume é gerado apenas pela poluição oriunda de roupas[2], logo, indubitavelmente, a indústria da moda alcança uma assustadora posição entre as mais poluentes, sendo, portanto, um player global, essencial para a missão climática.

Transformar essa realidade, ainda que seja tarefa difícil, é possível, pelo engajamento social, especialmente em prol de um desenvolvimento sustentável, o que contribui para que cenas como o cemitério de roupas usadas no deserto do Atacama, ponto de descarte têxtil há 15 anos e que afeta 300 hectares[3], não se cristalize como uma problemática sem solução.

Com o interesse em reverter esta situação, a moda circular, fundamentada no conceito de ecoeficiência, representa uma solução auxiliar à preocupação com o meio ambiente.

Nesse sentido, é possível projetar uma transição gradativa do setor têxtil para o modelo do slow fashion que, por sua vez, consiste em uma ideia de um desenvolvimento de produtos projetados, em ciclo contínuo em que vigora a concepção da produção consciente e reinserção dos seus materiais na economia após uso.

Feitas essas considerações, percebemos que, nos países mais desenvolvidos, a preocupação com o meio ambiente se instalou há anos, inclusive através da implementação de políticas públicas.

Tal como sinalizado por Harold Tillman, conselheiro de negócios e empresas na London College of Fashion, durante a realização do London Fashion Week[4], evento em que se discutia sobre a relevância de uma atuação fiscal para a real efetividade de políticas ambientais, não basta uma mera dependência na escolha pessoal do consumidor, é necessário reconhecer o impacto de freios fiscais para tornar mais atrativo o trabalho daqueles que agem de forma mais sustentável e ética, visto que existem incentivos fiscais no Reino Unido para carros e outros produtos mais sustentáveis, merecendo os mesmos benefícios a “ethical fashion”.

No Brasil, o art. 225 da CF/88 afirma que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Assim, não se trata de um direito e dever de uns, senão de todos que usufruem dessa garantia.

É justamente sob este contexto que se fazem essenciais as políticas públicas, sendo estas, por sua essência, o vínculo entre os interesses do Estado e do povo em comunhão.

Percebemos uma relevante oportunidade para as políticas públicas tributárias, ou seja, uma atuação do Direito Tributário como meio para, por meio da extrafiscalidade, atuar em uma determinada situação, tanto para incentivar certas práticas, quanto para coibi-las.

É um exemplo recente desse raciocínio o PL nº 270/22, o qual, além de tratar diretamente sobre a indústria têxtil, realiza um interessante vínculo com o Direito Tributário. A ideia consiste em instituir um “sistema nacional de logística reversa de resíduos têxteis após o descarte, para fins de conservação e preservação do meio ambiente, com a participação incentivada de fabricantes, importadores, distribuidores, comerciantes e consumidores do produto”.

O PL move todos os agentes necessários aos olhos da CF/88, na medida em que prevê campanhas educativas e recompensas tributárias para empresas da cadeia têxtil. Nesse viés, os custos e despesas operacionais com logística reversa e publicidade poderão ser abatidos do imposto devido pelo contribuinte fabricante ou importador, na proporção de até 2,0% a ser apurado no ajuste anual.

Não pretendemos apresentar todas as nuances do complexo sistema tributário, senão demonstrar que os tributos, pela extrafiscalidade, podem e devem conduzir condutas assertivas no ordenamento em todos os setores.

Isso ocorre porque a tributação ambiental é fundada em duas premissas básicas, gerar recursos voltados à prestação de serviços de natureza ambiental (aspecto arrecadatório) e induzir os contribuintes a adotarem comportamentos sustentáveis (aspecto extrafiscal), sendo utilizado, para tanto, a concessão de incentivos fiscais, tais como as isenções, deduções, técnicas de progressividade, entre outras modalidades.[5]

Não defendemos aqui a concessão de benefícios fiscais sem limites, ou indeterminados, mas a criação de políticas públicas razoáveis e específicas que, de forma transitória, permitam a implementação de condutas.

Na nossa visão, os benefícios devem impactar a cadeia como um todo, para que, no final, o bolso do consumidor seja tão atrativo quanto a sua consciência, sendo esse, portanto, o papel pedagógico dos tributos.

Afinal, muito embora a CF/88 enalteça que todos os indivíduos têm direito ao meio ambiente equilibrado, o resultado dessas ações depende de uma cooperação de toda a sociedade, seja por parte dos consumidores e das indústrias ao compreenderem os impactos de cada aquisição, seja por parte do ente público, ao viabilizar cadeias produtivas mais sustentáveis.

Nossa conclusão é que os tributos ambientais representam um importante mecanismo para uma sociedade que busca balancear os anseios naturais do mercado e a preocupação com o meio ambiente, elo crucial entre o setor privado e o Estado.

Vivemos em tempos que a poluição global atinge níveis alarmantes, que estão colapsando todo o sistema ecológico, a ponto de se tornar quase irrecuperáveis as diversas tragédias ambientais causadas pelas ações humanas. Por isso, o tempo de criar medidas ambientais protetivas é agora.

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Notas

[1] ONU. Disponível aqui.

[2] ONU. Disponível aqui.

[3] BBC NEWS BRASIL. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-60144656.

[4] BRITISH FASHION COUNCIL. Disponível em: https://www.britishfashioncouncil.co.uk/About.

[5] COSTA, Regina Helena. Apontamentos sobre a tributação ambiental no Brasil. In: TÔRRES, Heleno Taveira (org.). Direito tributário ambiental. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 312-332


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