Estados ainda exigem ICMS nas transferências entre estabelecimentos
05 de janeiro de 2024
A pretexto de cumprir a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) na
Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº 49 acerca da não
incidência do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços
(ICMS) nas transferências de mercadorias entre estabelecimentos, o
Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ) aprovou o Convênio
ICMS nº 178 de 2023, que, todavia, mantém a cobrança do imposto na
remessa interestadual. Nem mesmo a posterior edição da Lei Complementar
nº 204 de 2023 que adequadamente afirmou a inexistência de fato gerador
de ICMS nas referidas transferências, assegurou a manutenção dos
créditos da não cumulatividade e o direito, se o contribuinte quiser, de
transferi-los para o estabelecimento de destino nas remessas
interestaduais, mudou a posição dos Estados que, então, descumprem a ADC
nº 49 e a Lei Complementar nº 204 de 2023.
O Convênio ICMS nº
178 de 2023, que dispõe sobre a remessa interestadual de bens e
mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade e vem sendo
adotado pelos Estados como parâmetro para supostamente cumprir a decisão
na ADC nº 49, faz exatamente o contrário daquilo que foi decidido pelo
STF ao exigir que os contribuintes lancem “a débito na escrituração do
estabelecimento remetente” o valor correspondente à aplicação da
alíquota interestadual sobre o valor da transação de transferência. Ora,
o lançamento a débito corresponde à incidência do ICMS, especialmente
quando o registro é feito em caráter obrigatório e tem por implicação a
cobrança do imposto no Estado de Origem, justamente o que o STF afirmou
ser inconstitucional.
A bem da verdade, o Convênio ICMS nº 178 de
2023 manteve, sob o manto da suposta não incidência com transferência
obrigatória de créditos fiscais, exatamente a sistemática de incidência
que sempre foi aplicada pelos Estados e pelo Distrito Federal para
cobrar o ICMS nas transferências de mercadorias entre estabelecimentos.
Na mesma linha do Convênio, alguns Estados já editaram regulamentações
internalizando a norma do CONFAZ, como é o caso do Estado de São Paulo
por meio do Decreto nº 68.243 de 2023, e do Estado do Espírito Santos
por meio do Decreto nº 5590-R de 2023.
Vale destacar que a Lei
Complementar nº 204 de 2023 previa ainda a possibilidade de os
contribuintes optarem por manter um regime jurídico de incidência ficta
do ICMS nas transferências de mercadorias entre estabelecimentos, o que
era favorável aos casos submetidos a regimes especiais de tributação que
conferem benefícios fiscais a partir da incidência do imposto. Todavia,
referido dispositivo foi vetado pelo Presidente da República e o veto
ainda será apreciado pelo Congresso Nacional. De toda forma, neste
particular o Convênio nº 178 de 2023 adequadamente estabeleceu que a
sistemática adotada não terá como efeito a modificação de benefícios
fiscais de ICMS.
Enfim, considerando-se que as normativas que vem
sendo editadas pelos Estados com base no Convênio ICMS nº 178 de 2023
mantêm a cobrança do ICMS nas transferências interestaduais de
mercadorias entre estabelecimentos, em flagrante violação à decisão do
STF na ADC nº 49 e à Lei Complementar nº 204 de 2023, vislumbra-se a
possibilidade de contribuintes afetados negativamente pelo procedimento
proporem medidas judiciais defendendo seus direitos de não se submeterem
ao tributo indevido nas referidas remessas.