Renda auferida no exterior por intermédio de Trusts passa a ser tributada pelo IRPF
26 de dezembro de 2023
Os trusts passarão a ser tratados como transparentes para fins fiscais, ou seja, os rendimentos e os ganhos produzidos pelos ativos do trust, mesmo que em titularidade do trustee, serão tributados como se fossem detidos diretamente pela pessoa física instituidora ou beneficiária. Essa é mais uma inovação trazida pela Lei nº 14.754 de 2023, que passa a reger a tributação do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) sobre investimentos detidos no exterior a partir de janeiro de 2024.
O trust é uma figura contratual estrangeira utilizada para gerenciar, preservar e distribuir bens e direitos. É uma estrutura legal na qual um indivíduo ou uma entidade (chamado de "settlor" ou "grantor") transfere a propriedade de ativos para um terceiro (o "trustee") para o benefício de outras pessoas (os "beneficiários"). O trustee administra esses ativos de acordo com os termos e as condições estabelecidas no instrumento de trust. A ausência de legislação específica sobre trusts no Brasil criou diversos desafios significativos na caracterização e na regulamentação desse instrumento. A falta de um tratamento jurídico claro para os trusts resultava em interpretações diversas e em incertezas especialmente quanto aos efeitos fiscais deles decorrentes.
O artigo 10 da Lei nº 14.754 de 2023 estabelece que os bens e os direitos objeto do trust deverão ser declarados diretamente pelo instituidor, de acordo com o custo de aquisição e independentemente da data de aquisição, e permanecer sob sua titularidade, passando ao beneficiário apenas no momento da distribuição ou do falecimento do proprietário, o que antes se concretizar. Caso os ativos sejam transferidos ao trust de forma irrevogável, os bens e direitos deverão ser declarados pelo beneficiário do trust.
Ou seja, em que pese para os demais fins de direito os ativos sejam considerados de titularidade do trustee¸ que deverá gerir e preservar o patrimônio em favor dos beneficiários, para fins fiscais os bens e direitos, e a renda deles decorrentes, serão considerados de titularidade do instituidor ou do beneficiário, a depender do caso concreto.
Desse modo, os rendimentos e os ganhos oriundos dos ativos do trust serão sujeitos à incidência do IRPF, considerando-os como obtidos pelo instituidor ou pelo beneficiário, na data da criação do trust, da distribuição dos bens ou do falecimento do proprietário, conforme análise a ser realizada no caso a caso.
Cumpre destacar que a legislação em referência produz efeitos apenas no âmbito de aplicação do IRPF, que considera ocorrida doação quando da transferência dos ativos em vida ao quando ocorrida enquanto o instituir estiver vivo, e herança quando ocorrer depois do seu falecimento. Não há efeitos quanto à incidência do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis ou Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCMD) sobre a mudança de titularidade do patrimônio do trust, que será considerada como doação na transferência dos bens ao trustee e na transferência dos bens ao beneficiário.
Para o cumprimento do disposto na Lei nº 14.754 de 2023, o instituidor ou os beneficiários do trust deverão providenciar, no prazo de até 180 dias contados da data da publicação, a alteração da escritura do trust, ato escrito de manifestação de vontade do instituidor que rege a instituição e o funcionamento do trust e a atuação do trustee, ou carta de desejos, ato suplementar em relação às vontades que devem ser executadas pelo trustee. Dessa forma, devem ser adotados atos visando não apenas o normal cumprimento das regras do trust, mas também os atos necessários para o cumprimento da legislação tributária.