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Corte Especial do STJ deverá se manifestar sobre Verbete Sumular 343 do STF

Societário

27 de abril de 2023

O teste dos limites da coisa julgada parece estar em pleno vapor perante os tribunais superiores no ano de 2023. Após polêmica decisão em que o STF considerou que "as decisões proferidas em ação direta ou em sede de repercussão geral interrompem automaticamente os efeitos temporais das decisões transitadas em julgado nas referidas relações" (Temas 881 e 885 das repercussões gerais), a flexibilização da estabilidade das decisões judiciais poderá em breve ganhar um novo capítulo, desta vez no STJ.

Como sabemos, de modo a prestigiar a segurança jurídica, o STF editou o Verbete Sumular nº 343, dispondo sobre o não cabimento da ação rescisória "quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais". O enunciado decorreu de entendimento prévio formado pela corte em repercussão geral, oportunidade em que estabeleceu que "Não cabe ação rescisória quando o julgado estiver em harmonia com o entendimento firmado pelo Plenário do Supremo à época da formalização do acórdão rescindendo, ainda que ocorra posterior superação do precedente" (Tema nº 136).

A orientação nos parece ter um objetivo lógico: além de prestigiar a estabilidade das decisões judiciais, evitar que a ação rescisória seja utilizada pelas partes como sucedâneo recursal — preocupação de longa data dos tribunais responsáveis pelo julgamento de tais feitos.

Afinal, caso autorizado às partes o seu ajuizamento com base em interpretação controvertida, a ação rescisória ganharia os mesmos contornos dos recursos cabíveis contra orientações divergentes entre tribunais sobre uma mesma legislação, competência já conferida, por exemplo, ao recurso especial por força do artigo 105, III, "c", da Constituição, e aos embargos de divergência, conforme artigos 1.043 e seguintes do CPC.

No entanto, acórdão recente do STJ sobre a aplicação do Verbete Sumular nº 343 poderá causar impactos severos no entendimento histórico daquela corte sobre a hipótese de cabimento da ação rescisória.

Finalizado em fevereiro de 2023, o julgamento da Ação Rescisória nº 6.015, pela 1ª Seção do STJ, admitiu o ajuizamento da rescisória fundada no artigo 485, V, do CPC/73 (o qual veicula a possibilidade de rescisão do acórdão que "violar literal disposição de lei") tendo em vista que o entendimento transitado em julgado no acórdão rescindido foi posteriormente revisto pelo STJ em julgamento sujeito ao rito dos recursos repetitivos.

Ocorre que, à época em que transitou em julgado, o acórdão rescindido, proferido no bojo do Recurso Especial nº 1.427.246 / SC, encontrava-se em plena harmonia com a orientação da Corte Superior. Tanto que o relator, ministro Og Fernandes, deu provimento ao recurso de forma monocrática com fulcro no artigo 557, §1º-A, do CPC/73 [1].

Ou seja, por óbvio que, à época em que foi proferido, era entendimento assente que o acórdão do Recurso Especial nº 1.427.246 / SC não violava qualquer disposição de lei, o que desautorizaria de plano o ajuizamento da ação rescisória com base no artigo 485, V, do CPC/73, conforme Verbete Sumular nº 343 do STF.

Mesmo assim, o relator da Ação Rescisória nº 6.015, ministro Gurgel de Faria, optou por acatar o pedido formulado pela PGFN sob o argumento de que a manutenção do entendimento favorável ao contribuinte representaria violação aos princípios constitucionais da isonomia e da livre-concorrência, em clara análise consequencialista da questão, superando o racional até então vigente no STJ, resumido no emblemático voto proferido pela ministra Eliana Calmon ao julgar a Ação Rescisória nº 3.525/DF, quando concluiu com toda razão que "Oscilações jurisprudenciais existem e existirão sempre, cabendo ao Poder Judiciário deixar em garantia as suas próprias decisões, respeitando-as dentro do tempo em que foi proferida".

Importante mencionar, neste aspecto, que há pouco menos de um ano, a 2ª Seção do STJ decidiu pela impossibilidade de mitigação do enunciado da Súmula nº 343 do STF, ao julgar os Embargos de Divergência no Recurso Especial nº 1.508.018/RS.

Naquela oportunidade, a 2ª Seção definiu que, apesar da existência de divergência perante o STJ sobre o cabimento da rescisória, tal ação somente poderia ser veiculada "quando a divergência acerca da interpretação de texto legal já tiver sido superada em momento anterior à prolação da chamada sentença rebelde", prestigiando, assim, a segurança-jurídica e devolvendo ao Verbete Sumular nº 343 do STF a sua ratio essendi.

O entendimento da 2ª Seção do STJ, com o qual não podemos deixar de concordar (sob pena de normalização da ação rescisória como sucedâneo recursal), foi inclusive destacado pelo professor e insigne processualista Cruz e Tucci em texto publicado nesta Conjur, assinalando que "o acórdão recorrido assentou que a Súmula 343/STF não admite mitigação, sendo de plena incidência para impedir a rescisão de julgados que tiverem sido baseados em texto legal de interpretação à época controvertida nos tribunais".

Assim, diante das posições aparentemente opostas adotadas pela 1ª e pela 2ª Seção do STJ, nos parece imperioso que a questão seja levada à Corte Especial do tribunal por meio de embargos de divergência, conforme competência definida no artigo 11, XIII, do seu Regimento Interno, devendo, ainda, ocorrer a modulação de efeitos, caso venha a prevalecer o entendimento posterior sobre a matéria, ou seja, aquele firmado pela 1ª Seção.

[1] "Se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior, o relator poderá dar provimento ao recurso".

Publicado no Conjur

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