Reconhecimentos

Imprensa

Desenvolvimento Social: o Programa "Mulher Cidadã - Cidadania Fiscal para Mulheres" e demais incentivos fiscais

Tributário

15 de março de 2023

O dia 8 de março é internacionalmente conhecido como o dia das mulheres desde 1975, mas, diferentemente de outras datas comemorativas, essa não foi criada com cunho comercial e tem raízes históricas mais profundas, que remontam a diversos momentos na história global, nos quais as mulheres foram à luta para reivindicar direitos básicos que garantissem a elas dignidade humana.

No início do século XX, a luta das mulheres era por direitos que hoje são considerados essenciais, como uma jornada de trabalho justa, proteção e investigação dos crimes de violência, direito a escolher os seus representantes na política e de se elegerem para representar outras mulheres, entre outros aspectos reivindicados na época.

Hoje, muitas batalhas foram vencidas, mas outras ainda precisam de atenção para um mundo mais igualitário. Os desafios são inúmeros.

De acordo com uma pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), dos 12 milhões de desempregados no Brasil, ao final de 2022, 6,5 milhões eram mulheres. Além disso, as mulheres ganham em média 20% menos que os homens no Brasil, quando comparados os profissionais do mesmo perfil de escolaridade, idade e na mesma categoria de ocupação.

A desigualdade também é nítida quando se observa, inclusive, as estatísticas do Governo Federal. Dados do Painel Estatístico de Pessoal, do Ministério da Economia (ME), mostram que nos 88 postos do 1º escalão - ministros de Estado, secretários executivos e assessores especiais - apenas 11 (ou 12%) são ocupados por pessoas do gênero feminino.

Conforme indica o relatório global de desigualdade de gênero publicado em 2022 pelo Fórum Econômico Mundial, que reúne 146 nações, o Brasil ocupa o 94º lugar no ranking. Cumpre observar que o relatório é construído a partir de quatro pilares: participação e oportunidade econômica, nível educacional, saúde e sobrevivência e empoderamento político - cada um deles reúne uma série de indicadores.

Com base nas últimas estimativas da Organização das Nações Unidas (ONU), ainda serão necessários 300 anos para que a igualdade de gênero seja alcançada no mundo.

Feitas essas considerações preliminares, entre tantos outros pontos, percebemos que a interdisciplinaridade entre o Direito Tributário e as demais áreas do direito possibilita a consolidação de práticas que promovem o desenvolvimento social, pois o Direito Tributário surge como instrumento hábil à tutela dos direitos fundamentais (incentivando ou inibindo condutas).

Buscando garantir desenvolvimento profissional às mulheres, recentemente, o Ministério da Fazenda criou o Programa "Mulher Cidadã - cidadania fiscal para mulheres", instituído pela Portaria nº 26, de 24 de fevereiro de 2023, que tem como foco principal ofertar ações de orientação e capacitação às mulheres em situação de vulnerabilidade ou/e de risco social, auxiliando-as a sair da informalidade e conquistar segurança social.

Entre outras finalidades do programa, cabe destacar os seguintes objetivos: a) prover instrução e orientação para que mulheres em situação de risco e vulnerabilidade possam empreender; b) auxiliar mulheres na aquisição de autonomia financeira e obtenção de renda, em benefício das suas famílias e comunidades; c) expor as vantagens decorrentes da formalização empresarial, especialmente em relação à segurança social; d) promover a educação fiscal e a compreensão da função socioeconômica dos tributos; e) auxiliar a regularização fiscal e f) estimular a participação ativa do cidadão na construção de uma sociedade mais justa.

Esse novo programa foi inspirado em um projeto já experimentado pela Receita Federal do Brasil (RFB), direcionado para mulheres em situação de fragilidade social, desenvolvido no Núcleo de Apoio Contábil e Fiscal (NAF) de uma instituição de ensino no Município de Lauro de Freitas, no Estado da Bahia, que tem como principal função fomentar o potencial do modelo empresarial MEI (microempreendedor individual) na emancipação econômica de mulheres em situação de risco e de vulnerabilidade social na região. Muitas vezes, elas não têm rendimento próprio e ficam sujeitas às situações potencialmente perigosas, abusivas e à pobreza extrema.

A intenção do "Programa Mulher Cidadã" é que todas as ações sejam implementadas pela atuação de universidades parceiras, com os seus professores e alunos na promoção de conhecimentos técnicos, suporte e mentorias em educação fiscal, financeira, securitária e previdenciária. Por conseguinte, será possível gerar um ciclo virtuoso de conhecimento e ações efetivas, como um mecanismo auxiliar de transformação social.

Muito embora o programa seja benéfico à população de modo geral, é importante destacar que há, ainda, outras formas do Governo garantir um ambiente mais equilibrado entre homens e mulheres, inclusive no âmbito tributário, incorporando, verdadeiramente, ações sociais e auxiliando na redução das desigualdades.

Nessa perspectiva, tramitam no Congresso projetos de lei que objetivam instituir benefícios fiscais para empresas que contratarem mulheres. Um exemplo disso é o Projeto de Lei nº 324/2022, da Deputada Tabata Amaral (PSB-SP), que reduz de 20% para 10% a alíquota de contribuição de empresas à seguridade social para contratação de mulheres. Em síntese, a alíquota reduzida deve valer por 18 meses após a contratação de trabalhadoras e poderá também ser usada para mulheres transgênero.

Para se beneficiar desse incentivo, a proposta estabelece que a empresa deverá comprovar que o número total de trabalhadoras contratadas ou terceirizadas é superior ao mês anterior da aprovação da lei. O Ministério do Trabalho e Previdência deve avaliar e acompanhar o programa, que terá validade de cinco anos, até 2027, passível de prorrogação.

A ideia dessa proposta tem inspiração em uma reforma implementada na Itália em 2012, que também reduzia a contribuição patronal em 50% para contratação de mulheres. O benefício era concedido por 12 meses, com possível prorrogação para 18 meses e havia a contrapartida de aumentar o número de empregados.

O resultado no país europeu foi positivo. Isso ocorre porque a medida não afetou os salários líquidos das mulheres, de modo que a incidência do tributo recaiu sobre as empresas, levando à redução do custo por trabalhadora e à geração de empregos para elas. Também não há evidências de que a política tenha afetado os empregos de homens e mesmo após o fim do benefício, a maior parte dos empregos gerados foi mantida.

Há também os Projetos de Lei apensados de nºs 3414/2019 e 1740/2021, entre outros, que têm como objetivo principal conceder incentivo fiscal no imposto de renda às empresas que contratem mulheres vítimas de violência e/ou financeiramente dependentes. Todos os projetos estão em análise pela Câmara dos Deputados.

Por sua vez, no âmbito da Reforma Tributária, especialistas já sugeriram mudanças para enfrentar a desigualdade de gênero, à luz dos princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade e da essencialidade. Todavia, esse tema ainda não tem sido abordado com ênfase nas discussões do Governo.

Há que se mencionar ainda que, dentre às propostas atualmente em discussão sobre a Reforma Tributária, há aquelas que sugerem a vedação de qualquer tipo de benefício fiscal, como é o caso da Proposta de Emenda Constitucional nº 45/2019, que seria prejudicial sob a perspectiva de maior equilíbrio social de gênero no país.

Diante dessas breves reflexões, em que pese a Constituição Federal garantir igualdade entre os indivíduos, o que nos resta saber é se, dentre os 513 deputados eleitos (423 homens e 90 mulheres), há um consenso sobre a necessidade de mudanças, como a inclusão das mulheres - de forma igualitária - no mercado de trabalho e no que tange ao desenvolvimento social.

Publicado na Análise Editorial

O Direito levado ao mais alto nível, para oferecer soluções seguras e eficientes a empresas e empresários.